35 ANOS SOBRE A CONVENÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA
E CONTINUAMOS A PRECISAR CLAMAR PELOS SEUS DIREITOS!
“A Humanidade deve à criança o melhor que tem para dar”
In Declaração Universal dos Direitos da Criança, no dia 20 de novembro de 1959, pela Organização das Nações Unidas
Este ano completam-se 100 anos sobre a adoção da Declaração de Genebra sobre os Direitos das Crianças, promovida pela então Sociedade das Nações. Nessa data, e pela primeira vez, foi reconhecido o direito de a criança ser protegida, independentemente de qualquer consideração de raça, nacionalidade ou credo.
A 20 de novembro de 1959, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Declaração dos Direitos da Criança. No mesmo dia, em 1989, a Assembleia Geral adotou por unanimidade a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), documento ratificado em 1990 por Portugal.
A CDC introduz uma mudança paradigmática no que respeita aos direitos da criança, colocando a criança como sujeito de direitos, e impondo obrigações aos Estados na “proteção, provisão de bem estar e promoção da participação das crianças.”
Passados 35 anos sobre a Convenção, e 100 sobre a Declaração de Genebra, precisamos de um balanço das conquistas na sua implementação em Portugal, bem como identificar os desafios e prioridades para alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável até 2030. Neste contexto sublinha-se o objetivo de reduzir pelo menos para metade o número de crianças que vivem em agregados familiares pobres. Os números da pobreza infantil fazem-nos acreditar que as políticas postas em marcha não têm sido capazes de atacar o problema, por forma a resolvê-lo.
Este cenário deixa-nos um sentimento de perplexidade, porque face a tantas conquistas efetuadas nos vários domínios da vida social, económica, cultural, científica e tecnológica, continuamos muito atrasados relativamente a conquistas em favor do bem-estar das crianças. Do ponto de vista legislativo foram, de facto, muitas as conquistas efetuadas nesta área, no entanto, ainda não correspondem a uma efetiva intervenção/ação em prol do bem-estar de todas as crianças. A equidade de oportunidades é posta em causa!
O Governo tem a responsabilidade de escolher as políticas mais adequadas para debelar a pobreza infantil e de encontrar o respetivo financiamento. Por sua vez, as autoridades locais e regionais partilham a responsabilidade de aplicar essas políticas no terreno.
Apesar da proliferação de uma multiplicidade de Estratégias e Planos que impactam direta ou indiretamente na vida das crianças, tem de se questionar: Qual tem sido o seu real impacto na vida e no bem-estar das crianças? Estaremos mesmo a investir no presente e futuro das crianças? De que maneira?
No âmbito do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, a Pobreza Infantil surge destacada com uma meta europeia de redução de 5 milhões de crianças em situação de pobreza até 2030 e cada Estado membro assumiu metas nacionais. Em Portugal, definiu-se como meta a redução de 50% (partindo do número de 360 mil crianças em 2019).
Encontramo-nos em 2024, e os últimos dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que reportam aos rendimentos de 2022, revelam um aumento da taxa de pobreza infantil – 347 mil crianças em risco de pobreza monetária (mais 44 mil do que no ano anterior). A taxa de risco de pobreza infantil em 2023 foi de 20,7% (regresso aos valores de 2017). As crianças constituem o grupo etário que regista a maior taxa de risco de pobreza e também aquele em que se observa uma evolução mais desfavorável deste indicador.
O cenário atual não nos confere garantias de que em 2030 o país esteja a cumprir a meta estabelecida – o facto de neste momento existirem diversas estratégias que visam o bem-estar das crianças que não assumem a articulação necessária para garantir a prossecução das metas previstas não nos deixa descansados. Falamos da Garantia para Infância, da Estratégia Nacional para os Direitos da Criança 2021-2024 e da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza 2021-2030 (eixo 1).
Precisamos centrar as nossas atenções nas causas do problema e na melhor forma de o debelar, utilizando todos os recursos disponíveis, sendo que é prioritário conhecer o problema, sabendo que são múltiplos os seus contornos: a escassez de rendimentos familiares (em regra associados aos salários baixos e precariedade laboral), condições habitacionais precárias e pobreza energética, desigualdades no acesso a uma educação de qualidade e inclusiva, dificuldade no acesso a cuidados de saúde mental, perigos do mundo digital/ exclusão digital, os fenómenos migratórios, a violência e delinquência juvenil, os abusos, etc.
O diagnóstico rigoroso e atual do problema leva-nos a uma ação mais consciente e eficiente e é necessário imprimir alguma mudança na intervenção nesta área específica da infância.
Isto porque poderemos correr o risco de não chegar às crianças, privando-as de uma infância capaz de impulsionar o seu potencial.
Apelamos, portanto, a um investimento:
Num diagnóstico aprofundado da situação das crianças em Portugal, tendo como unidade de análise e de medida a criança;
Na implementação de políticas dirigidas ao rendimento das famílias com crianças;
Na promoção de projetos de promoção e reforço dos direitos e bem-estar das crianças;
Numa “abordagem baseada nos direitos da criança” enquanto sujeito de direitos, como sustentado pelo Comité dos Direitos da Criança, que seja clara, integradora e coordenada da intervenção para o desenvolvimento de políticas e programas que garantam o superior interesse das crianças;
Na auscultação dos pais e das crianças que se encontram em situação de pobreza.
novembro, 2024
Elaborado por EAPN Portugal | novembro 2024 [clique aqui para descarregar]
Os subscritores:
Amélia Bastos, Instituto Superior de Economia e Gestão / Universidade de Lisboa
EAPN Portugal / Rede Europeia Anti Pobreza
Fernando Diogo, Professor Associado com Agregação da Universidade dos Açores e Investigador do
CICS.NOVA e do CICS.UAc
Instituto de Apoio à Criança
Liliana Fernandes, Professora Auxiliar, Universidade Católica Portuguesa, Católica Porto Business School,
Centro de Estudos em Gestão e Economia
Manuel Sarmento, Universidade do Minho
Maria do Céu Brandão, Associação de Solidariedade e Ação Social de Santo Tirso
Maria João Leote de Carvalho, Investigadora, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Centro
Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade NOVA de Lisboa
Natália Fernandes, Professora Associada com Agregação Universidade do Minho, Instituto de Educação,
Departamento de Ciências Sociais da Educação, Centro de Investigação em Estudos da Criança
Rita Valadas, Cáritas Portuguesa
Sérgio Costa Araújo, Perito Independente nas áreas dos Direitos da Criança e Pobreza Infantil